Entendendo a memória muscular

Atualmente muitos estudos vêm desvendando os processos da memória. De uma forma geral, todas as informações que utilizamos em nosso dia-a-dia estão relacionadas à memória. São dados novos que precisam ser armazenados, por alguns milésimos de segundo ou por décadas, ou conhecimentos que são recuperados em nossos arquivos cerebrais para dar sentido aos acontecimentos que nos cercam. Esse processo é feito de forma cruzada e simultânea, em que múltiplas memórias estão envolvidas.

Ao ler este texto, por exemplo, o leitor utiliza seus aprendizados de leitura já automatizados, interpreta os grupos de palavras de acordo com conhecimentos preliminares, aprende coisas novas e armazena os significados contidos nos parágrafos anteriores para dar sentido aos posteriores. Enquanto isso, o corpo não se esquece de manter a respiração e a circulação ativas, enquanto os olhos decodificam os símbolos ou letras, que formam as palavras escritas.

Muitas vezes ficamos surpresos com nós mesmos quando temos que realizar alguma tarefa que há muito tempo já não realizamos, e conseguimos as executar com facilidade e muitas vezes com perfeição. Isso acontece porque todos nós temos várias informações armazenadas na nossa memória, que se subdivide em vários tipos, cada uma responsável por um tipo de informação ou um determinado período de acontecimento dos fatos.

Às vezes também nos deparamos com situações novas que temos facilidade em aprender porque já vivenciamos situações parecidas, que nos deram uma base para aprendermos novas tarefas. Isso acontece muito quando relacionamos o exemplo à atividade física, principalmente as esportivas. A esses tipos de informações armazenadas na memória, chamamos de memória muscular, um tipo de memória relacionada com ações musculares aprendidas pelo nosso corpo.

Os processos envolvidos nos vários tipos de memória estão sendo aos poucos desvendados pelos cientistas, mas os estudos não são simples de serem realizados. As descobertas são baseadas, principalmente, em testes com animais ou observações em humanos que possuem lesões cerebrais, frutos de acidentes ou má formação. Antes de falar sobre memória muscular, vamos ver um breve histórico da descoberta da memória, assim como o que é memória, e quais são os seus tipos e suas subdivisões.


UM POUCO DE HISTÓRIA SOBRE A MEMÓRIA
Até meados do século XX, a maioria dos estudos sobre aprendizagem questionava que as funções da memória seriam localizadas em regiões cerebrais específicas, alguns chegando a duvidar de que a memória seria uma função distinta da atenção, da linguagem e da percepção. Acreditava-se que o armazenamento da memória seria distribuído por todo o cérebro.

A partir de 1861, estudos evidenciaram que lesões restritas à parte posterior do lobo frontal, no lado esquerdo do cérebro, chamada de área de Broca, causavam um defeito específico na função da linguagem. Após essa localização da função da linguagem, os neurocientistas tornaram a voltar-se para a hipótese de se localizar a memória.

Wilder Penfield foi o primeiro a conseguir demonstrar que os processos da memória têm localizações específicas no cérebro humano. Penfield havia estudado com o pioneiro em neurofisiologia, Charles Sherrington. Na década de 1940, Penfield começou a usar métodos de estimulação elétrica, idênticos aos usados por Sherrington em macacos, para mapear as funções motoras, sensoriais e da linguagem no córtex humano de pacientes submetidos à neurocirurgia, para tratamento de epilepsia. Penfield explorou a superfície cortical em mais de mil pacientes e verificou que a estimulação elétrica produzia o que ele chamou de resposta experiencial, ou retrospecção, na qual o paciente descrevia uma lembrança correspondente a uma experiência vivida.

Estudos em pacientes com lesão do lobo temporal revelaram dois modos particularmente diferentes de aprendizagem, diferença que os psicólogos cognitivistas avaliaram em estudos com sujeitos normais. O ser humano aprende o que é o mundo apreendendo conhecimento sobre pessoas e objetos, acessíveis à consciência, usando uma forma de memória que é em geral chamada de explícita, ou aprende como fazer coisas, adquirindo habilidades motoras ou perceptivas a que a consciência não tem acesso, usando para isto a memória implícita.


O QUE É A MEMÓRIA
A memória é uma das funções cognitivas mais complexas que a natureza produziu, e as evidências científicas sugerem que o aprendizado de novas informações e os seus respectivos processos de armazenamento causam alterações estruturais no sistema nervoso. A memória é a capacidade de reter, recuperar, armazenar e evocar informações disponíveis, seja internamente, no cérebro (memória humana), seja externamente, em dispositivos artificiais (memória artificial).

A memória humana focaliza coisas específicas, requer grande quantidade de energia mental e deteriora-se com a idade. É um processo que conecta pedaços de memória e conhecimentos a fim de gerar novas idéias, ajudando a tomar decisões diárias. Memória, segundo diversos estudiosos, é à base do conhecimento. Como tal, deve ser trabalhada e estimulada. É através dela que damos significado ao cotidiano e acumulamos experiências para utilizar durante a vida.

A memória tem a função de promover a adaptação do ser ao meio, contribuindo para a sua sobrevivência. No caso dos humanos, “a complexidade é maior pela participação da linguagem, e pela modulação por sentimentos, emoções e estados de ânimo”.


COMO FUNCIONA A MEMÓRIA
Os mecanismos bioquímicos de memória são muito complexos, como muito apropriadamente coloca o pesquisador Iván Izquierdo, um estudioso da área de neurobiologia da memória, “… somos aquilo que recordamos, literalmente. Não podemos fazer aquilo que não sabemos como fazer, nem comunicar nada que desconheçamos, isto é, nada que não esteja na nossa memória…”. “Eu sou quem sou, cada um é quem é, porque todos lembramo-nos de coisas que nos são próprias e exclusivas, e não pertencem a mais ninguém. As nossas memórias fazem com que cada ser humano ou animal seja um ser único, um indivíduo”.

Mas, afinal, por quais mecanismos formamos a memória? Na verdade, há evidências de que formamos memória por mais de um mecanismo bioquímico, dependendo do tipo da memória formada. Há evidências, também, de que os mecanismos pelos quais formamos a memória de um fato (aprendemos), são diferentes dos mecanismos pelos quais a evocamos (lembramos deste fato).

Conseqüentemente, teremos que classificar os tipos de memória, brevemente, e tecer algumas considerações sobre algumas estruturas cerebrais envolvidas na formação da memória.

A partir da década de 1970, a neurociência passou a contar com técnicas de imagem cerebral, como a tomografia por emissão de pôsitrons (PET) e a ressonância magnética funcional (FMRI) que evidenciam algumas áreas envolvidas nos processos ligados à memória. Embora esses recursos tenham contribuído para compreender quais áreas estão envolvidas nas etapas de aquisição da informação, consolidação e evocação (memória, propriamente dita), poucos acreditam que haja uma correspondência direta entre uma região do cérebro com a função que exerce, tamanha é a complexidade do nosso aparelho cerebral.

Quando falamos em memória, insistem os pesquisadores, não falamos em informações que são guardadas intactas, mas fragmentos ou traços que são armazenados e recuperados em forma de memória. “Formamos novas memórias sobre outras mais antigas, eventualmente modificando-as e inventando mentiras verídicas”. Isso equivale dizer que as memórias não são amostras fiéis de fatos reais, mas construções que são modificadas conforme o contexto em que são recuperadas e em meio a um intenso trânsito de sinapses (espaço entre neurônios, onde ocorre a transferência de informações em forma de impulsos elétricos).

Um sem números de cheiros, sabores, objetos, rostos, conhecimentos, sons, tatos, medos, números, comportamentos e cenários vão sendo estocados em nosso cérebro. Ele é capaz de nos remeter à infância, em questão de segundos, quando sentimos um cheiro familiar. Somos capazes de lembrar o momento exato em que aquele perfume fazia parte de nossas vidas. Isso quer dizer que de nada valeria tanta informação guardada se ela não pudesse ser rapidamente recuperada. No momento da evocação de uma memória, forma-se um percurso sináptico em que cada sinapse possui um caminho de reações bioquímicas, como se cada lembrança tivesse uma reação em cascata própria, um trajeto que a localizasse em meio a tantas informações. No caso da evocação, esse percurso é mais curto e mais simples do que na formação de cada memória.

O início da formação das memórias se dá na fase conhecida por aquisição e que consiste na chegada das informações aos sistemas sensoriais (visual, tátil, auditivo, olfativo e gustativo) na forma de estímulos. Os dados que chegam ao cérebro são, então, processados em diferentes regiões e resultam em memórias que podem ser, basicamente, de três tipos, de acordo com a duração. As operacionais ou de trabalho – só têm tempo de permanecer alguns segundos ou minutos em mente, antes de desaparecerem por completo. As outras duas deixam vestígios e seguem em um processo que as consolidarão como memórias de curto ou longo prazo. Nessa fase, iniciada a partir de um período de 1 a 6 horas após a aquisição, há participação da amígdala, do septo, do hipocampo e do córtex enterrinal. As de duração mais curta – que duram de 3 a 6 horas – ocorrem paralelamente às de longo prazo – com duração de 6 horas em diante -, embora haja interação entre elas. As memórias de menor duração precisam recorrer às de maior duração, já estabelecidas, para fazerem sentido e poderão, eventualmente, tornar-se memórias de longa duração.

A formação de memórias, desde a aquisição, passando pela consolidação até chegar à evocação ou lembrança, são processos dependentes da transmissão de informações célula a célula por meio da ajuda de neurotransmissores ou moléculas, que agem no espaço existente entre dois neurônios (sinapses). Essas substâncias são responsáveis por ampliar a comunicação entre as células, uma vez que permitem a ligação de receptores na membrana da célula, que é assim estimulada, provocando o desencadeamento de uma cascata de reações químicas. Entre as muitas reações, os neurotransmissores costumam ativar enzimas (proteínas que aceleram reações químicas), que entram no núcleo da célula, ativando genes que, então, sintetizam proteínas. Essas proteínas estão envolvidas não apenas na formação inicial da memória, mas também no momento de recrutá-las como lembranças, para então serem rearmazenadas.


Os estímulos que o cérebro recebe através dos sentidos promovem uma seleção de combinações neurais, que foram desenvolvidas de modo variável na fase de embrião do organismo, conectadas em ‘mapas’. A estrutura do cérebro e seu funcionamento são, portanto, determinados pelo contexto e pela história do desenvolvimento celular.

A memória depende de nossa capacidade de (re) categorizar os traços de informações, que ocorre na forma de ligações entre grupos neuronais de mapas diferentes, e que é temporariamente fortalecida e constantemente afetada pelas condições emocionais presentes e motivacionais, que podem facilitar ou dificultar seu resgate. Quando ocorrem lesões que impedem o fluxo de informações por um determinado caminho, os neurônios são capazes de fazer novas conexões que permitirão a melhora das capacidades sinápticas, resultando até na recuperação de informações ou performance. A capacidade dos neurônios de se transformar, adaptando sua estrutura ao contexto (plasticidade neural), seria o suporte desse funcionamento da memória.


DEFININDO OS DIFERENTES TIPOS DE MEMÓRIAS
Apesar da existência de vários modelos explicativos para o funcionamento da memória, uma das questões que ainda intriga os pesquisadores é a relação entre a memória de curta e a de longa duração. Alguns defendem que a memória de curta duração seria apenas o início do processo que levaria à formação de uma memória de longa duração. No entanto, a maioria dos resultados obtidos nas pesquisas sobre o assunto tem sinalizado para a existência desses dois mecanismos distintos, funcionando de forma independente, mesmo quando agem na mesma estrutura do cérebro.

Mais importante que definições gerais, para entender a memória humana é fundamental saber os processos que envolvem a aquisição, armazenamento e evocação de cada tipo de memória. Para isso, o primeiro passo é saber que não existe uma memória, mas sim vários tipos de memória que se relacionam para formar “a memória” que usamos no dia-a-dia.

As classificações mais utilizadas para memórias são estabelecidas de acordo com o tempo de duração, função e conteúdo de cada uma delas. E, ao contrário do que se pensa comumente, o processo de memória não acontece apenas quando apreendemos algo novo (arquivamos), ou lembramos de algo (recuperamos). Há também a memória de curto prazo ou memória de trabalho, que alguns pesquisadores preferem não chamar de memória, mas sim de central de gerenciamento.

Quanto ao seu conteúdo, as memórias podem ser classificadas como “declarativas”, que são aquelas que conseguimos verbalizar, como um fato; e “não-declarativas” ou “de procedimento”, que são aquelas memórias que não conseguimos verbalizar. Na segunda categoria (memória “de procedimento”) incluem-se atividades motoras complexas (memória muscular), como dirigir um automóvel, tocar piano, andar de bicicleta, etc… O aprendizado e a formação desses dois tipos de memória dependem basicamente de estruturas cerebrais diferentes. As memórias de procedimento são menos estudadas, porque parecem ser menos suscetíveis ao esquecimento. Assim, pacientes com dificuldade de lembrar fatos podem, com freqüência, não ter dificuldade para dirigir um carro ou andar de bicicleta.

As memórias declarativas, por outro lado, são bastante estudadas e são classificadas quanto ao seu tempo de duração como imediata ou de trabalho, de curta e de longa duração.

A memória de trabalho pode ser ilustrada como a memória de um número de telefone que consultamos na lista telefônica, e que geralmente esquecemos logo após tê-lo digitado. Este tipo de memória não deixa “traços”, ou seja, não forma “arquivos”; e parece depender da atividade elétrica de células de uma região cerebral denominada córtex pré-frontal. Pelo fato da memória imediata não deixar traços é que, antes do aparecimento da tecla de “re-discar” nos aparelhos de telefone, tínhamos que consultar a lista telefônica tantas vezes. A memória de trabalho é responsável por gerenciar nossa realidade, ela determina se a informação é útil para o organismo e deve ser armazenada, se existem outras informações semelhantes em nossos arquivos de memória e, por último, se esta informação deve ser descartada quando já existe ou não possui utilidade.

As memórias de curta duração (que duram poucas horas) e as memórias de longa duração (que duram meses, ou anos), por outro lado, formam “traço” de memória. O período em que ocorre a formação do traço de memória é chamado de período de “consolidação”. Durante esse período (que na memória de longa duração corresponde a algumas horas após o aprendizado), a memória é lábil e sensível a vários tratamentos (fármacos e drogas de abuso, por exemplo) ou eventos, como um traumatismo craniano. Assim, quando sofremos um acidente de carro em uma viagem, é freqüente que esqueçamos não só de como aconteceu o acidente, mas também de eventos que tenham ocorrido alguns minutos antes do mesmo, como uma parada para abastecimento do carro, por exemplo.

Há que se considerar, também, que a evocação da memória não é tão somente a “reativação” do traço de memória. É freqüente que, quando evocamos uma dada memória, somente parte dela seja restituída, ou podemos confundir pensamentos e associações ligadas diretamente à memória evocada. Assim, o processo de evocação da memória implica também em uma “reconsolidação” da memória prévia, uma vez que a informação armazenada é modificada durante a sua evocação. Isto avança um pouco o conceito de memória, porque faz com que o traço de memória seja suscetível a transformações. De fato, a memória é extremamente dinâmica, e conforme afirmam estudos, “lembrar implica num processo ativo de reconstrução e não se assemelha a assistir a uma fita de vídeo do passado”. Enfim, tão dinâmica quanto a própria memória, é a plasticidade cerebral que a acompanha, a qual parece ser o mecanismo pelo qual aprendemos e lembramos.

As memórias referenciais também podem ser classificadas de acordo com seu conteúdo como é o caso da memória declarativa, que se subdivide em memórias declarativas episódicas, quando se referem à lembrança de algo que assistimos ou vivenciamos, incluindo o contexto espacial e temporal de eventos, bem como as emoções envolvidas e as memórias pessoais; ou declarativas semânticas, quando são referentes a noções gerais adquiridas de forma indireta, ou seja, é uma memória de conceito de informações, como a lembrança de um livro que lemos. As principais áreas responsáveis pelas memórias episódicas e semânticas são o hipocampo e o córtex entorrinal.

As memórias referentes a hábitos como andar de bicicleta, saltar e soletrar, são chamados de memórias procedurais ou de procedimento. Estas podem ser explícitas, adquiridas com plena consciência; ou implícitas, como a maioria das memórias procedurais, adquiridas de maneira involuntária. A memória de procedimentos é a capacidade de reter e processar informações que não podem ser verbalizadas. Ela é mais estável, mais difícil de ser perdida.

Os psicólogos e neurologistas distinguem memória declarativa da memória não-declarativa (ou memória procedural). A grosso modo, a memória declarativa armazena o saber que algo se deu, e a memória não-declarativa o como isto se deu. Aprendemos sobre o que é o mundo adquirindo conhecimento sobre pessoas, lugares e coisas, que é acessível à consciência, usando uma forma de memória que é em geral chamada de explícita. Ou aprendemos como fazer coisas adquirindo habilidades motoras ou perceptivas a que a consciência não tem acesso, usando a memória implícita.

“Os sistemas de curto e longo prazo de memória estão ligados, transferindo informações continuamente de um para outro. Quando necessário, o conteúdo da memória de longo prazo é transferido para o armazenamento da memória de curto prazo. O sistema de curto prazo ou memória de trabalho recupera as memórias, tanto de curto quanto de longo prazo”.


RESUMINDO A MEMÓRIA MUSCULAR
A memória muscular esta relacionada com a memória procedimental, ou seja, é a memória dos atos motores, do saber fazer alguma coisa. É a memória para hábitos ou habilidades, ela esta ligada a aquisições de vivências (experiências) que fornecem ao indivíduo a capacidade de evocar as experiências passadas, ou seja, resgata as informações do comportamento motor para dar conta, da melhor maneira possível, de uma necessidade imposta ao indivíduo, para realizar um evento no tempo presente.

Ela esta relacionada ao condicionamento clássico, como a calistenia, ou seja, aqueles exercícios esteriotipados que você aprende a fazer por repeti-lo várias vezes. É uma memória ativa por determinados estímulos que quando ocorrem te faz agir mecanicamente.

Você usa a memória muscular, em praticamente todos os momentos da sua vida, tanto de forma consciente quanto inconsciente, tudo vai depender de quanto de atenção você necessita para realizar uma determinada ação.


ATÉ QUANDO A MEMÓRIA MUSCULAR É VÁLIDA
A memória muscular está contida na memória procedural ou de procedimentos, e como foi visto nos parágrafos acima, este tipo de memória é difícil de ser perdida, como é o caso que acontece nos esportes e outros vários gestos motores, que mesmo ficando um longo tempo sem realizar determinados gestos ou movimentos, conseguimos fazê-los com facilidade se estes foram uma vez aprendidos, pois eles ficam armazenados em nossa memória procedimental, e ao tentarmos realizá-los novamente, evocando esta informação, acabamos por fazer um reconsolidação da informação e recomeçamos a realizar os determinados movimentos de forma meio descordenada, precisando apenas de prática para aperfeiçoá-los.

Outro caso em que vemos as vantagens da memória muscular é dentro das academias, na área da musculação. Quando comparamos o processo evolutivo de dois indivíduos que estão iniciando um programa de treinamento, com a mesma rotina de treino e a mesmas cargas, sendo que um indivíduo esta treinando pela primeira vez, enquanto o outro já treinou no passado e está há um bom tempo afastado. Inicialmente podemos até não perceber nenhuma diferença entre estes dois indivíduos quando eles começam a rotina de treino, porém logo após o início, o indivíduo que já possui uma base na musculação, começa a evocar as informações contidas na sua memória procedural e começa a realizar os exercícios com maior perfeição, conseguindo assim aumentar as cargas com maior facilidade, e conseqüentemente, tem um feedback muscular antecipado em relação ao indivíduo que nunca praticou musculação. Este talvez seja o motivo pelo qual desenvolvemos rapidamente quando voltamos a malhar.


A MEMÓRIA MUSCULAR PODE GERAR EFEITOS NEGATIVOS PARA NÓS?
Existe uma situação em que a memória muscular não é benéfica pra nós, isto acontece principalmente quando a relacionamos com acidentes, traumas e lesões. Nas lesões, a memória muscular muitas vezes acaba indo contra nós mesmos, ou seja, as pessoas ficam tensas ou mostram outros sinais psicológicos quando simplesmente perguntadas sobre as suas lesões, ou quando tentamos tocar o local lesionado, isto é conhecido como memória emocional.

Porem, existe um processo desenvolvido por estudiosos da área para reverter esse mecanismo. O processo de lesão nos esportes, desenvolvido por Tim Hallbom e Suzi Smith, permite a substituição da memória muscular da lesão por alguma outra memória que não envolva trauma. O efeito disso é que a dor e os sintomas psicológicos reduzem ou mesmo desaparecem, permitindo uma recuperação mais fácil e mais rápida da lesão.

Muitas vezes os atletas têm uma memória precisa das vezes em que algo saiu errado, bem como de quando atingiram um resultado conveniente. Esse desenvolvimento utiliza as suas estratégias existentes a fim de mudar o comportamento indesejado para algo aproveitável e valioso. Para os atletas, é desejável manter a sua disposição e a seqüência do processo, pois isso resulta numa mudança mais rápida e mais fácil.

Os atletas desenvolvem uma boa memória muscular e aumentam a sua coleção de informações com práticas constantes e treinamentos. Algumas vezes, eles conservam uma memória muscular que não é aproveitável, ficando inconscientes de que isso pode impedir uma melhora no desempenho.


Por Raphael Lorete
CREF 9576-G/RJ
Graduado em Educação Física
Pós-Graduado em Musculação e Personal Trainner


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