Importância do período de recuperação depois do exercício

O corpo humano necessita de atividade física assim como necessita de descanso para que haja um perfeito funcionamento de suas funções vitais no decorrer dos anos de vida de cada indivíduo. Ou seja, é necessário que haja um equilíbrio entre desgaste e reposição para boa manutenção do estado físico e funcional do corpo. Assim sendo, vamos analisar a importância do descanso após a atividade física no que diz respeito ao corpo, em sua forma estrutural e fisiológica.

Quando o corpo realiza qualquer função - seja física, fisiológica, ou mental – há um gasto energético para que isto ocorra. Ou seja, o nosso corpo utiliza um combustível chamado ATP (adenosina trifosfato) para qualquer ação que ele realiza. Esse gasto energético ocorre pela utilização da energia livre de um fosfato inorgânico liberado pela quebra do ATP, que posteriormente passa a se chamar ADP (adenosina difosfato), pois o ATP perde um fosfato, então para que esse ADP se restaure a forme outro ATP é necessário que o corpo humano disponha de substratos energéticos (fontes alimentícias) e repouso.

Os substratos energéticos são provenientes dos alimentos, ou dos suplementos, e são eles os carboidratos (glicose), as proteínas (aminoácidos) e os lipídeos ou gorduras (ácidos graxos) - os substratos provenientes dos suplementos são absorvidos em menor tempo e com maior facilidade pelo nosso organismo.

Numa escala gradativa de utilização de substratos energéticos pelo corpo humano, primeiro se utiliza o ATP (duração aproximada de 3 a 6 segundos), depois a fosfocreatina (que é responsável pela resíntese (reconstrução) do ATP, e tem duração de 10 a 15 segundos aproximadamente), depois o organismo solicita a utilização das reservas de glicose, principalmente a hepática (armazenada no fígado) e sanguínea, e glicogênio muscular (armazenado nos músculos). A energia proveniente da glicose, resintetiza o ATP permitindo prolongar o exercício físico por alguns minutos, levando em consideração que quanto mais intensa for à atividade menor será o tempo de duração da mesma, pois o corpo entrará em fadiga.

Acabando essas reservas energéticas e o corpo estando ainda em atividade, e havendo um equilíbrio entre o consumo e o gasto de oxigênio, o organismo começa a utilizar-se de gordura, mais precisamente triglicerídeos, para prolongar a atividade física por mais tempo; caso não haja o equilíbrio entre o gasto e consumo de oxigênio, o corpo entra em fadiga e ocorre a interrupção do exercício.

Deve-se levar em consideração que o organismo tem duas fases distintas: o catabolismo (que é o consumo (gasto) de energia) e o anabolismo (que é a síntese (estoque) de energia), e quando estamos realizando uma atividade de qualquer natureza o evento que ocorre é o catabolismo, e quando estamos em repouso, no momento de descanso, ou durante o sono, o evento que ocorre é o anabolismo. (Veja o artigo Anabolismo x Catabolismo)

Então, quando utilizamos estas informações para uma melhor performance no treinamento, podemos chegar à conclusão que o descanso, ou repouso, é tão importante quanto o treinamento. Dito isto pelo fato de que enquanto treinamos não estamos ganhando nada, na verdade estamos perdendo, estamos catabolizando energia, destruindo nossas fibras musculares, gastando nossas reservas energéticas, estamos gerando estresse muscular para durante o repouso, ou período de recuperação, termos o momento do anabolismo, de recuperação dos substratos energéticos gastos durante a atividade física, e a reconstrução das fibras musculares lesionadas.

A fase de anabolismo é melhor aproveitada pelo organismo se houver uma dieta de supercompensação, ou seja, ao termino da atividade física até quatro horas após, deve-se ingerir carboidrato (ou hipercalórico) e proteína (ou aminoácido), que são respectivamente responsáveis pela restauração das reservas de ATP e reconstituição das fibras musculares.

O período de recuperação existe durante o treinamento diário, ou seja, entre as séries de um mesmo exercício e entre diferentes exercícios contidos em nosso programa de treinamento. Assim como também ocorre entre os diferentes dias de treinamento, onde podemos ter um período de recuperação de 24, 48, ou 72 horas, dependendo do tipo de treinamento prescrito para cada indivíduo. Porém quem deve determinar este período é o professor de musculação, que é o profissional de educação física com conhecimentos de musculação, treinamento desportivo, fisiologia e outras áreas estudas no período de graduação deste profissional.

A freqüência do treino depende da divisão da rotina de treinamento. Para iniciantes, três sessões semanais trabalhando o corpo inteiro geralmente são o mais indicado; sessões separadas por um intervalo de 48 horas parecem ser adequadas para uma boa recuperação. Sistemas de treinamento de três ou mais dias consecutivos, seguidos por um dia de descanso, são característicos de fisiculturistas, ou praticantes veteranos que estão próximos ao ápice de desenvolvimento da hipertrofia muscular.

Segundo Tesch (1994), realizar duas sessões de treinamento para cada grupo muscular (por semana) é suficiente para induzir uma resposta adaptativa ótima para hipertrofia muscular.

No entanto, quando o número de sessões aumenta, é necessário um planejamento mais detalhado para que haja uma recuperação adequada, dividindo assim os músculos a serem trabalhados em dias diferentes. Para treinos intensos, muitos praticantes adotam intervalos superiores a 48 horas para cada grupo muscular, porém a resposta individual nesse caso é o que mais importa.

Uma das variáveis mais negligenciadas durante o planejamento do treino é o tempo de descanso entre as séries e os exercícios. Os intervalos nem sempre são respeitados, principalmente em academias, onde muitas vezes a conversa demasiada ou a pressa de ir embora faz com que essa variável seja desprezada. Entretanto, temos que nos atentar a esse importante item, pois ele pode ter um papel decisivo em relação ao objetivo do praticante.

Para que se possa atingir o objetivo de forma plena, é necessário que haja o respeito dos intervalos, pois eles proporcionarão a faixa média ideal de recuperação para cada objetivo.

Segundo McArdle (et al), para treinar o sistema de energia glicolítico a curto prazo (sistema prioritário utilizado no treinamento de força e hipertrofia), o intervalo de recuperação é o dobro do intervalo de trabalho, ou uma relação de 1 para 2. Essas relações específicas de trabalho e recuperação para treinamento anaeróbico permitem supostamente uma restauração suficiente dos fosfatos intramusculares (ATP) e/ou a remoção suficiente do ácido láctico (resíduo químico derivado da quebra do ATP na ausência de oxigênio), de forma a permitir que a próxima sessão de exercício possa prosseguir sem qualquer fadiga ou com fadiga mínima.

Diminuir o intervalo entre as séries e os exercícios também é uma forma de intensificar o treino, pois fazendo essa manobra há redução no tempo de recuperação, tornando o treino mais cansativo. Com a diminuição do intervalo entre as séries, o que pode ser modificado são as repetições máximas, visto que com o maior intervalo é possível utilizar mais peso, pois o tempo de recuperação acaba sendo maior. Já com o intervalo menor, os pesos são menores, porém o treino se torna mais intenso metabolicamente e a concentração de lactato pode ser maior, criando um ambiente mais propício para um treino de hipertrofia.

Abaixo vemos uma recomendação do período de recuperação semanal, e entre séries e exercícios durante um programa de treinamento:

- Força – freqüência semanal: 2 – 3 dias para o mesmo grupo muscular (*depende do grau de treinabilidade do praticante, da intensidade e do volume de treinamento); intervalo entre as sessões é de 48 a 72 horas em média; intervalo entre as séries e os exercícios deve ser igual ou maior que 3 minutos.

- Hipertrofia – freqüência semanal: 1-3 dias para o mesmo grupo (*depende do grau de treinabilidade do praticante, da intensidade e do volume de treinamento); intervalo entre as sessões é de 48 a 72 horas em média; intervalo entre as séries e os exercícios deve ser igual ou menor que 1,5 minuto.

- RML - freqüência semanal: maior que 3 dias para o mesmo grupo muscular (*depende do grau de treinabilidade do praticante, da intensidade e do volume de treinamento); intervalo entre as sessões é de 24 a 48 horas em média; intervalo entre as séries e os exercícios deve de 30 segundos a 2 minutos (caso for acima de 30 repetições).


- Potência - freqüência semanal: 2 dias para o mesmo grupo muscular (*depende do grau de treinabilidade do praticante, da intensidade e do volume de treinamento); intervalo entre as sessões é de 48 a 96 horas em média; intervalo entre as séries e os exercícios deve ser maior que 3 minutos.

Com o treinamento regular intenso e prolongado, sem um período de recuperação adequado, certos praticantes experimentam a síndrome de supertreinamento (overtraining), ou “fadiga”. Como resultado, fica deteriorada a realização do exercício normal. Pois o indivíduo apresenta uma dificuldade cada vez maior de recuperar-se após uma sessão de treino.

A condição de supertreinamento é mais que uma simples incapacidade temporária de treinar com a intensidade habitual ou de um ligeira queda no nível de desempenho durante o treinamento; pelo contrário, envolve uma fadiga mais crônica evidenciada tanto durante as sessões de exercícios quanto nos períodos subseqüentes de recuperação. Está associado também com um desempenho sistematicamente precário na realização dos exercícios, infecções freqüentes e um mal estar geral e falta de interesse no treinamento de alto nível. As lesões por uso excessivo também são mais freqüentes no estado de supertreinamento, assim como insônia, perda de peso, estado de humor perturbado, caracterizado por fadiga geral, depressão e irritabilidade.

Segundo Wilmore, apesar das causas da quebra no desempenho não serem totalmente compreendidas, o supertreinamento freqüentemente parece estar associado aos períodos de excesso de treinamento. Quando a carga de treino é muito intensa ou o volume de treinamento ultrapassa a capacidade do corpo de recuperação e de adaptação, o organismo apresenta mais catabolismo (degradação) do que anabolismo (acúmulo).

McArdle e colaboradores citam que a periodização apropriada do treinamento contribui de maneira significativa para prevenir a síndrome de supertreinamento. Mais especificamente, professores e praticantes terão que proporcionar uma recuperação adequada durante os ciclos de treinamento mais intenso. Salienta ainda que a nutrição torna-se particularmente importante durante o treinamento árduo, devendo ser enfatizado especialmente o reabastecimento de glicogênio (tempo de recuperação suficiente com a suplementação de carboidratos dietéticos) e a reidratação.

Como conclusão deste estudo, vimos que o período de recuperação é essencial para recuperação das reservas de substratos energéticos e das taxas de oxigênio, prevenção de lesões e otimização do treinamento de alto rendimento.


Referências Bibliográficas:


McArdle, W. D.; Katch, F. I.; Katch, V. L. FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO. Energia, Nutrição e Desempenho Humano. 4.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S.A., 1998.
Pollock, M. L. E Wilmore, J. H. EXERCÍCIOS NA SAÚDE E NA DOENÇA, Avaliação e prescrição para prevenção e reabilitação. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. Médica e Científica Ltda., 1993.
Rodrigues, Carlos Eduardo Cossenza, e Carnaval, Paulo Eduardo. MUSCULAÇÃO: teoria e prática. 21. ed. - Rio de Janeiro: Sprint, 1985.

Tesch, P. A. Training for bodybuilding. Strength and power in sport. P.V. Komi (Ed.) Oxford: blackwell Science, 1994.

Uchida, M.C. et al. Manual de musculação: uma abordagem teórico-prática do treinamento de força. 2.ed. – São Paulo:Phorte 2004.

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